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segunda-feira, 9 de maio de 2011

Revoluções na Cosmologia nos últimos 20 anos

O conhecimento científico está sempre se transformando e a cosmologia, incluindo os modelos sobre o Big-Bang, não é exceção. Nos últimos 20 anos, houve uma verdadeira revolução na área. E pode ser que o melhor ainda esteja por vir.

Ao contrário do que muitos possam imaginar, a teoria do Big-Bang original tinha muitas inconsistências teóricas que só foram resolvidas nos anos 90. Apesar de suas previsões concordarem quantitativamente com as observações, havia problemas qualitativos imensos. Por exemplo, parecia implicar em que um de seus parâmetros tivesse valor 1 com uma precisão de 1 em 1062 - sem razão aparente nenhuma para isso. E isso era só um dos problemas.

Em 1980, um aperfeiçoamento na teoria feito por Alan Guth, chamada teoria inflacionária, resolveu esses problemas com uma tacada só. Segundo ele, o Universo teria se expandido muito rapidamente logo no início - esticou-se 1078 vezes em 10-32 segundos (!). Essa "esticada" radical eliminaria as inconsistências. O preço foi postular um campo de forças (chamado "inflaton") que produzisse essa inflação.

A partir de 1992, as previsões dessa teoria começaram a ser confirmadas por observações. Rapidamente, a teoria inflacionária foi levada ao nível da ortodoxia, povoou os livros-textos de cosmologia e tornou-se o paradigma dominante na área.

Mas essas mesmas observações que corroboraram a inflação também levaram a outra descoberta sensacional: que a quantidade de energia e de matéria "comum" no Universo, que forma planetas, estrelas etc. (a chamada "matéria bariônica") constitui apenas 4% de toda a massa do cosmo! Ninguém sabe o que é o resto. Chamou-se-a de "matéria escura".

Nos anos 1990, o advento dos telescópios em satélites artificiais como Hubble, livres da interferência da atmosfera terrestre, e dos detectores de precisão neles instalados, produziu uma mudança tão grande nas possibilidades de observação que os astrofísicos falam no advento de uma "era da cosmologia de precisão". Um novo "instrumento" foi descoberto, as supernovas distantes. Por causa da uniformidade da sua luminosidade, elas mostraram-se o mais preciso "detector de distâncias" conhecido.

Com as supernovas, em 1999 houve outra descoberta espetacular: que a expansão do Universo está se acelerando. Surpresa total, pois imaginava-se que a força gravitacional dos astros do cosmo a faria desacelerar. Ninguém sabe por que há a aceleração. Por falta de nome melhor, chamam o agente misterioso de "energia escura". Sabe-se hoje que a energia escura perfaz 73% da massa do Universo, enquanto a matéria escura 23% e a matéria e energia ordinárias apenas 4%.

Apesar de a natureza da matéria escura e da energia escura serem desconhecidas, não foi difícil adaptar o modelo cosmológico inflacionário para incluir parâmetros que representassem ambas. O modelo atual mais aceito é chamado "Λ-CDM" (Lambda-Cold Dark Matter), onde lambda (Λ) é a constante cosmológica, o parâmetro que representa a energia escura (há vários outros modelos alternativos, porém).

A revolução ainda não terminou. O modelo inflacionário atual pode fazer previsões quantitativas que concordam excelentemente com as observações, mas também sofre de problemas qualitativos grandes, como o Big-Bang original. Um é que ele supõe um momento inicial de densidade de matária e energia infinitas. Há dezenas de modelos alternativos tentando evitar essa "singularidade inicial" - vários dos quais incluem uma era pré-Big-Bang.

Na última Scientific American Brasil (de maio), apareceu um artigo de Paul Steinhardt no qual ele mostra outras inconsistências aparentemente graves. Comento esse artigo no último post do blog A Física se Move. Vários físicos dizem que elas serão solucionadas com algum aperfeiçoamento do modelo, mas sem abdicar da ideia central da inflação, tal como aconteceu com o Big-Bang original em 1980. Outros acham que a teoria deve ser substituída. Por enquanto, é esperar que observações mais precisas façam o tira-teima entre as diversas possibilidades.

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