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quinta-feira, 12 de maio de 2011

Exercícios simples de alongamento e abdominais

A vida pode ficar bem melhor com alguns exercícios físicos simples que podem ser feitos em casa. Mas é necessário um pouco de orientação. Circulou pela Internet ontem um vídeo preparado pelo Portal Vital com o personal trainer Marcelo Lucon, da Academia Ativa, de São Paulo, ensinando como fazer abdominais (clique na figura ao lado).

Confesso que só conhecia a versão "cruel", dolorida e extraordinariamente cansativa desses exercícios, que aprendi em aulas de educação física no colégio. As mostradas pelo Lucon parecem agradáveis e simples.

Isso me fez lembrar de um conjunto de exercícios de alongamento que um amigo meu, professor de Educação Física, me passou em imagens há uns dez anos e me pediu para colocar no meu antigo site. Como o meu site já foi para o beleléu, que Deus haja, então posto novamente aqui.

A mensagem original do Marcão foi:
"Estou deixando uma sequência de alongamentos para o pessoal saber pelo menos que existe alguma coisa para nos deixar mais relaxados e dispostos nas apresentações. Alongamento não deve ser usado apenas para preparar para algo e sim devemos nos manter alongados. Se você estiver andando e torcer o pé, um dos motivos de a lesão ser feia é ter os músculos muito rígidos. É apenas um dos itens da boa disposição. Mas espero que ajude. Uma dica: se não tiver tempo para nada, faça pelo menos o que fica com as pernas para cima (90 graus) - no mínimo, antes de dormir - e, se possível, dê uma boa espreguiçada antes de se levantar."

Atenção: não exagere. Não é para doer muito. Não é treinamento para tropas de elite, é para ser simples e agradável. Se o corpo reagir de modo muito estranho, pare. Apesar de terem sido projetados para se fazer em casa, orientação em uma academia ou de um especialista só fará bem.








quarta-feira, 11 de maio de 2011

O Homem e o Universo (A. Koestler)

Uma narrativa deliciosa da história da astronomia ocidental, desde os gregos antigos até Isaac Newton, com ênfase nas biografias de Nicolau Copérnico, Johannes Kepler e Galileu Galilei. O título das primeiras edições brasileiras, que seguiram o título original, dá uma ideia da proposta da obra: "Os sonâmbulos" ("The sleepwalkers"). Não é apenas mais uma "demonstração" dos avanços consistentes da ciência astronômica desde seus pais ao longo do tempo. Pois seus primeiros protagonistas não eram cientistas no sentido moderno. Pelo contrário, viviam numa época em que não havia fronteira entre ciência e misticismo. A tônica do livro é a passagem dessa era para a moderna, a da "separação dos caminhos", por trajetórias muitas vezes erráticas.

Kepler é um exemplo cabal dessa época de transição. Procurava explicar o movimento dos planetas com métodos que hoje soariam no mínimo exóticos. Acreditava que esses astros emitiam sons harmônicos inaudíveis por ouvidos mortais. Assim, em seu livro "Harmonia dos Mundos", tentou encaixar regularidades nos movimentos planetários em uma sofisticada teoria musical. Seu livro está cheio de pautas com escalas musicais. Em certo ponto (no parágrafo 8), ele se pergunta - e responde: "Quais planetas cantam soprano, quais contralto, quais tenor e quais baixo?"

No entanto, Kepler pode ser também considerado um dos primeiros cientistas modernos, pois, quando uma teoria não se encaixava perfeitamente no que observava nos céus, ele tentava outra. E procurava acesso aos dados mais precisos disponíveis para testar seus modelos. Isso é uma atitude perfeitamente moderna.

Assim, ele chegou a abandonar a música das esferas para tentar encaixar os cinco sólidos regulares nas órbitas dos planetas. Também não deu certo. O detalhe é que essa atitude levou Kepler a abandonar também descobertas que hoje fazem parte do conhecimento científico e são ensinadas nas escolas. No seu esforço em procurar regularidades, que em certos momentos Koestler pinta com cores de desespero e loucura, consumindo o próprio ser de Kepler, o astrônomo acabou topando com suas famosas leis que descrevem o movimento dos planetas.

Essas leis arrebentavam com a cosmologia da época, pois rejeitavam que os planetas descrevessem círculos (a forma perfeita, bem adequada ao céu, morada divina), mas elipses (espécies de ovais). Na época, pode ter sido algo tão ou mais louco do que a harmonia das esferas parece hoje. Mas foram usadas por Newton quase cem anos depois para demonstrar sua lei da gravidade, por muito tempo um símbolo do sucesso da ciência moderna. Em seguida, Kepler a trocou pelo movimento das esferas, pela teoria dos sólidos regulares e outras.

O livro de Koestler é, assim, também uma narrativa da passagem hesitante e tateante de uma época em que não se fazia distinção entre ciência, religião, misticismo e esoterismo para outra em que uma fronteira estanque foi erguida entre a ciência e o resto (na verdade, isso aconteceu também com a religião ocidental). O capítulo final, "A separação dos caminhos", é dedicado àquele que pode ter sido o primeiro grande cientista no sentido moderno, e também o que simboliza o divórcio entre ciência e religião: Galileu Galilei. Foi dada ênfase no seu conflito com a Igreja. Cartas trocadas entre ele e a Santa Sé estão reproduzidas nas notas no final do volume. Vê-se que muitas vezes Galileu não facilitou muito as coisas para os que queriam botar as coisas em panos quentes no Vaticano.

Arthur Koestler (1905-1983), ensaísta húngaro, crítico feroz do stalinismo, era um escritor estiloso. A narrativa é de prender a atenção. E consegue combinar detalhes biográficos e científicos com um texto fluente, gostoso. Dá cor, espírito e emoção às buscas visionárias dos "sonâmbulos" pelos princípios fundamentais do cosmo. Para gente curiosa, o resultado é explosivo. Lembro-me de ficar agarrado com esse volume enquanto esperava ônibus na rodoviária, de pé, há 20 anos. Por pouco não perdi alguns.

terça-feira, 10 de maio de 2011

A vida depende de uma coincidência cósmica

Acabo de colocar uma postagem no blog A Física se Move sobre algo que me causou muita impressão. Ao que parece, a vida na Terra só pôde acontecer por causa de uma coincidência ainda não explicada envolvendo as energias dos núcleos atômicos de hélio, berílio e carbono. O carbono, como se sabe, é a base da vida na Terra. Sua origem está no interior das estrelas: assim como quase todos os outros elementos químicos, ele é formado por reações nucleares no núcleo estelar (os núcleos mais pesados são formados nas supernovas). Sem estrelas, só haveria hidrogênio e hélio. Nessas fornalhas cósmicas, núcleos de átomos de hélio e de berílio são fundidos para formar núcleos de carbono.

Acontece que a energia do núcleo de carbono é muito menor que a do hélio e a do berílio somadas. Pelas leis que regem as reações nucleares, isso torna extremamente improvável que a reação ocorra. E o carbono seria raríssimo.

A salvação está numa peculiar coincidência. O carbono, assim como qualquer outro núcleo atômico, possui um conjunto de outros estados com energias mais altas. Ele não pode ter qualquer energia, mas apenas algumas específicas. Uma dessas é - bingo! - quase igual à necessária para a reação ocorrer!

Por causa dessa coincidência, o carbono se forma abundantemente junto com oxigênio no interior das estrelas, e a vida na Terra (e sabe-se lá onde mais) pôde surgir.

Não há nenhuma lei da física conhecida que obrigue isso a acontecer. Na verdade, seria uma surpresa se tal lei existisse: pois pareceria uma lei física "construída" especificamente para que a vida pudesse surgir. O buraco é bem mais embaixo...

Falo mais detalhes no A Física se Move.

Post-scriptum: Há uma explicação possível. Talvez os parâmetros físicos de que dependem as energias do núcleo de carbono (constante de Planck, velocidade da luz no vácuo, massas das partículas elementares) sejam diferentes em regiões muito distantes do cosmo (muito mais distantes do que até onde os telescópios conseguem enxergar), de modo que necessariamente só poderíamos ter nascido onde ela tivesse a energia "certa". Ou então pode ser que elas variem no tempo. Só poderíamos então ter nascido numa época específica em que a energia seria a "correta" (como parece que os parâmetros não variaram muito desde perto do Big-Bang até hoje, isso só faria sentido em teorias alternativas de universos cíclicos, pulsantes, com vários Big-Bangs sucessivos). Essas hipóteses fazem parte de um tipo de raciocínio conhecido como "princípio antrópico".

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Revoluções na Cosmologia nos últimos 20 anos

O conhecimento científico está sempre se transformando e a cosmologia, incluindo os modelos sobre o Big-Bang, não é exceção. Nos últimos 20 anos, houve uma verdadeira revolução na área. E pode ser que o melhor ainda esteja por vir.

Ao contrário do que muitos possam imaginar, a teoria do Big-Bang original tinha muitas inconsistências teóricas que só foram resolvidas nos anos 90. Apesar de suas previsões concordarem quantitativamente com as observações, havia problemas qualitativos imensos. Por exemplo, parecia implicar em que um de seus parâmetros tivesse valor 1 com uma precisão de 1 em 1062 - sem razão aparente nenhuma para isso. E isso era só um dos problemas.

Em 1980, um aperfeiçoamento na teoria feito por Alan Guth, chamada teoria inflacionária, resolveu esses problemas com uma tacada só. Segundo ele, o Universo teria se expandido muito rapidamente logo no início - esticou-se 1078 vezes em 10-32 segundos (!). Essa "esticada" radical eliminaria as inconsistências. O preço foi postular um campo de forças (chamado "inflaton") que produzisse essa inflação.

A partir de 1992, as previsões dessa teoria começaram a ser confirmadas por observações. Rapidamente, a teoria inflacionária foi levada ao nível da ortodoxia, povoou os livros-textos de cosmologia e tornou-se o paradigma dominante na área.

Mas essas mesmas observações que corroboraram a inflação também levaram a outra descoberta sensacional: que a quantidade de energia e de matéria "comum" no Universo, que forma planetas, estrelas etc. (a chamada "matéria bariônica") constitui apenas 4% de toda a massa do cosmo! Ninguém sabe o que é o resto. Chamou-se-a de "matéria escura".

Nos anos 1990, o advento dos telescópios em satélites artificiais como Hubble, livres da interferência da atmosfera terrestre, e dos detectores de precisão neles instalados, produziu uma mudança tão grande nas possibilidades de observação que os astrofísicos falam no advento de uma "era da cosmologia de precisão". Um novo "instrumento" foi descoberto, as supernovas distantes. Por causa da uniformidade da sua luminosidade, elas mostraram-se o mais preciso "detector de distâncias" conhecido.

Com as supernovas, em 1999 houve outra descoberta espetacular: que a expansão do Universo está se acelerando. Surpresa total, pois imaginava-se que a força gravitacional dos astros do cosmo a faria desacelerar. Ninguém sabe por que há a aceleração. Por falta de nome melhor, chamam o agente misterioso de "energia escura". Sabe-se hoje que a energia escura perfaz 73% da massa do Universo, enquanto a matéria escura 23% e a matéria e energia ordinárias apenas 4%.

Apesar de a natureza da matéria escura e da energia escura serem desconhecidas, não foi difícil adaptar o modelo cosmológico inflacionário para incluir parâmetros que representassem ambas. O modelo atual mais aceito é chamado "Λ-CDM" (Lambda-Cold Dark Matter), onde lambda (Λ) é a constante cosmológica, o parâmetro que representa a energia escura (há vários outros modelos alternativos, porém).

A revolução ainda não terminou. O modelo inflacionário atual pode fazer previsões quantitativas que concordam excelentemente com as observações, mas também sofre de problemas qualitativos grandes, como o Big-Bang original. Um é que ele supõe um momento inicial de densidade de matária e energia infinitas. Há dezenas de modelos alternativos tentando evitar essa "singularidade inicial" - vários dos quais incluem uma era pré-Big-Bang.

Na última Scientific American Brasil (de maio), apareceu um artigo de Paul Steinhardt no qual ele mostra outras inconsistências aparentemente graves. Comento esse artigo no último post do blog A Física se Move. Vários físicos dizem que elas serão solucionadas com algum aperfeiçoamento do modelo, mas sem abdicar da ideia central da inflação, tal como aconteceu com o Big-Bang original em 1980. Outros acham que a teoria deve ser substituída. Por enquanto, é esperar que observações mais precisas façam o tira-teima entre as diversas possibilidades.