Interessante como às vezes soluções extraordinariamente simples resolvem problemas complexos cuja solução era procurada por anos. E também como, por detrás dessa simplicidade, podem se esconder raciocínios e procedimentos os mais sofisticados.
Vi um exemplo cabal quando analisava um artigo do ano passado sobre nanopartículas de platina, escrito por quatro químicos e um físico da Universidade Federal do Paraná e publicado na revista científica Chemistry of Materials. Nanopartículas são minúsculas partículas com apenas umas poucas dezenas ou centenas de átomos de diâmetro, sintetizadas em grande quantidade em laboratórios. São parte da grande vedete das fronteiras da ciência atuais, a nanociência.
O seu grande charme é a variedade de aplicações que possuem, especialmente as feitas de metais nobres (ouro, prata e platina) – vão desde a microeletrônica até o combate à artrite reumatóide. As de platina são mais usadas em células combustíveis – uma das tecnologias para diminuir a poluição por automóveis. São em geral produzidas com uma finíssima “capa” protetora feita de alguma substância orgânica cobrindo cada nanopartícula, para que elas possam permanecer indefinidamente misturadas com água ou com outro líquido (senão, teríamos apenas água com um pó metálico no fundo). E essas são minúsculas mesmo, às vezes com menos de 20 átomos de lado a lado (veja a figura acima; cada bolinha é um átomo!).
O problema que os paranaenses resolveram foi com as de platina. O caso era que um dos melhores métodos para fabricação de nanopartículas com capa, criado por Mathias Brust há 17 anos em Liverpool, simplesmente não funcionava com platina. Tentava-se em outros países do mundo pelo menos desde 2004 e nada. Na verdade, elas podiam ser feitas com outras técnicas, mas seria uma mão na roda se a de Brust pudesse ser usada, pois com ela pode-se controlar muito bem a qualidade das partículas e ela permite a produção de grandes quantidades a baixo custo.
A solução foi incrivelmente simples, dada a complexidade do assunto. O processo de produção envolve a mistura de quatro substâncias químicas, uma depois da outra. Se as regras forem seguidas direitinho, as nanopartículas simplesmente surgem no final, já encapadinhas e tudo – exceto com a platina... Pois os pesquisadores de Curitiba descobriram que, para as nanopartículas de platina aparecerem, você precisa apenas trocar a ordem de adição das duas últimas substâncias! Simples assim.
Não foi apenas uma ideia tirada da cartola que por acaso deu certo. Para provar que funciona, os cientistas tiveram que submeter o líquido escuro que obtiveram a onze experimentos diferentes, feitos em equipamentos de lá e do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron de Campinas. Usaram raios-X, a luz síncrotron e microscópios eletrônicos poderosos capazes de distinguir átomo por átomo (produziram a imagem do início deste texto). Aí não só provaram que o líquido estava abarrotado de nanopartículas, como também destrincharam o que as impedia de se formar antes. Fino.
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